quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Um bancário

Conto enviado por Rafael Chagas


A maravilha do mundo era meu emprego. E olhe que eu trabalhava todo empertigado. Adorava ficar o dia todo com a mão na merda. Uma merda perfumada como rosas de jardim. Passava o dia todo contando e distribuindo dinheiro. Sentia-me o mais sortudo dos homens. Trabalhar em banco é uma merda. Ser caixa de banco fede.

Não há mais nada sujo que dinheiro. Ele passa na mão de todo esse povo porco que anda por aí. Mas tudo bem, alguém tem que por a mão na bosta, não é verdade? E eu colocava com uma felicidade tão contagiante... Sorriso não existia. Qual é o caixa de banco que sorri? Somos praticamente uns robôs programados.

Todo dia era mesma rotina: aquele pão com margarina, o leitinho quente com café e a cagadinha básica. Bendito café que me levava à latrina logo cedo. Pensando bem, era bom... Saía leve de casa. Ia trabalhar levinho e contente. Almoçava numa salinha minúscula e cheia de mulheres lindas - lindas por fora é claro! Por dentro, umas vadiazinhas quaisquer. Todas separadas e com filhos criados pelas avós.

Eu era relativamente alto, com cabelo raspado - porque se crescesse enrolava e deixava-me com aspecto de mendigo. E em bancos não se trabalham mendigos... ou trabalham? Tinha um corpo atlético. Sou um rapaz boa pinta. Contava meus 33 anos e só tinha um defeito: a caiporice. Um azarado! Principalmente com as mulheres. Traçá-las era cotidiano. Bastava sair o meu presente mensal (aquele salário gordo, gordo como o gerente do banco), que dava pra pagar algumas meretrizes, a prestação de carro, o aluguel de apartamento e remédios para a senhora Minha Mãe. Uma velha senhora fodida e lascada na vida. Todo mundo é fodido hoje em dia. Imposto é o que não falta, então basta viver e deixar-se ser fodido pelo seu país- algo pra deleite diário.

Lá no fundo da alma eu gostava do banco (os psicólogos que expliquem esta contradição!). Era todo limpinho e tinha mulheres de decotes todos os dias. Minhas colegas de trabalho eram bem apessoadas e tudo mais. Vai ver eu era revoltado, revoltado com a vida! Uma mulher contribuiu pra isso. Eu, tolo, imbecil, deixei ela destruir minha paz, sujar-me o nome, deixar-me dívidas e feridas para o resto da minha vida. E não foram escaras na pele; foram feridas de verdade, num coração vagabundo de um otário qualquer, que não enxerga coisa alguma. Um fodido e largado na vida, que não acreditava em volta por cima. Eu sempre ruminava a carniça. Roeram o osso e deixaram a carne em putrefação.